Dom Francisco Silva descreve a igreja

"Já não existe o velho templo do Irmão Lourenço. Como a crisálida se transforma em mimosa borboleta, assim também se transformou nesse outro que é um verdadeiro mimo de arquitetura gótica..."

"Hino de granito aí está na encosta da Serra, cantando estrofes de pedra, na torre esguia e alta que, como a invocação de um poema sacro, sobe para o céu, em busca de inspiração; nas finas e delicadas colunas, como cantos diversos do mesmo poema, desdobra-se em episódios, ora singelos e frescos como as manhãs, ora trágicos e dolorosos, ponteados de pungentes saudades... e, como último cântico, o altar de mármore, em cujo trono, alvo como a cecém, aparece a Senhora Mãe dos Homens, na sua majestade meiga de Mãe, a convidar seus filhos da terra para junto de Jesus, seu filho do céu. Os mestres podem achar defeitos no conjunto arquitetônico, mas o coração, o coração dos fiéis acha um deslumbramento que o transporta além das misérias da terra, para essa região da piedade e da crença, toda banhada de claridades místicas..."
      

"Torre esguia a lutar com os montes na altura, atira a ponta aguçada de sua flexa para o azul do céu e depois, com pena da terra, abre os braços misericordiosos de sua cruz de pedra, para abranger maior espaço. Os contrafortes enegrecidos pelos temporais e brunidos pelo hálito frio dos ventos, caem-lhe pelos lados, como raízes gigantes a sustentar altaneiro tronco".
      

"A circunferência de enorme rosácea, rendilhada no duro granito, ostentando um olho, a que emprestam cambiantes matizes as cores de lindos vitrais, descansa sobre o pórtico, rasgado em cintro, que se vaza para fora, ornado de colunetas. A Senhora Mãe dos Homens com os braços abertos, na atitude carinhosa de quem quer acolher, lá está na imobilidade de sua bela estátua".
      

"No interior, linhas de colunas quais palmeiras, alteiam-se agrupadas quatro a quatro a receber a abóbada que se arqueia como a fronde de nossas árvores seculares".       

"Tudo convida ao recolhimento. Os altares que se estadeiam; as paredes em uniformidade estudada; as colunas que olham para o céu; a luz mortiça coando-se pelos vitrais e projetando-se em feixes de cores; o silêncio que se desprende das arcadas; a lâmpada que bruxuleia a medo; os bancos solitários que se enfileiram, como eterna lembrança das gerações que por ali passaram, tudo, tudo, enfim, fala à alma e convida à oração..."
      

"E lá de cima, no altar-mor, no seu nicho de mármore, em pé, Menino Jesus no braço, fronte cingida de rico diadema, a Senhora Mãe dos Homens, Soberana do Santuário do Caraça, olha com aveludado e macio olhar, alagado de ternura e misericórdia, para os que vêm a seus pés trazer suas queixas, contar suas mágoas, deixar transvazar o muito cheio de seu coração na prece ou no soluço, na súplica ou na lágrima quente que, silenciosa, lhes desliza até ao chão".
      

"Tal é o Santuário de Nossa Senhora Mãe dos Homens da Serra do Caraça". ( * )


Nota: Para o turista curiso daremos mais estes pormenores:

- Dizem que trabalharam na construção da igreja mais de 40 operários, sendo a maioria espanhóis e portugueses. Não consta houvesse escravos.
- Doze altares laterais, cada um com a imagem de um santo (homem). No altar-mor, a bela imagem de Nossa Senhora Mãe dos Homens, vinda   de Portugal, em 1784.
- Na entrada da igreja, dois altares barrocos, da antiga ermida do Irmão Lourenço, pintados a ouro por M. Ataíde, em 1807. Um é de Nossa   Senhora da Piedade.
- O mármore é todo mineiro, da Serra de Antônio Pereira, perto de Mariana.
- A pedra-sabão veio da chácara de Santa Rita, no Caraça.
- O vitral do meio é doação de D. Pedro II.
- No coro, o órgão, feito pelo Pe. Luís Boavida.
- Nas tribunas: o corpo de São Pio, mártir e a "Ceia de Ataíde".
- Os quarenta bancos de madeira são trabalho do Ir. Coadjutor João Batista Moermaens, sob a orientação do Pe. Boavida.
- Debaixo do altar de Santo Antônio, há uma placa de mármore assinalando o lugar onde, na antiga ermida, foi sepultado o corpo do Irmão   Lourenço de Nossa Senhora.
- Debaixo da igreja, as Catacumbas, onde estão sepultados os Padres e Irmãos Coadjutores da Congregação da Missão.


( * ) - SILVA, Francisco de Paula. "Caraça - Apontamentos históricos e Notas Biográficas - 2ª Parte - 1845-1903 - Caraça-Minas - Apud. R. A. P. M. Ano XII - 1907 - págs. 76 e 160, Belo Horizonte, Imprensa Oficial de Minas Gerais - 1908.

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ZICO, Pe. José Tobias. Caraça - Peregrinação, Cultura e Turismo, 1ª Ed.
Belo Horizonte, Ed. São Vicente, 1976. págs. 53 e 53.